O regime de comunhão parcial de bens é um dos mais comuns adotados nos casamentos e uniões estáveis no Brasil, onde os bens adquiridos durante a união são compartilhados igualmente entre o casal. Em recente decisão, a 4ª Turma Cível do TJDFT negou provimento ao recurso de uma ré que, mesmo após a separação, utilizava um imóvel adquirido durante o casamento, mas se recusava a pagar aluguel ao ex-marido, que continuava a arcar com os custos do financiamento. Esse caso reflete os direitos e deveres dos cônjuges após a dissolução da união, principalmente quanto ao uso e divisão dos bens comuns.
O que é o regime de comunhão parcial de bens?
O regime de comunhão parcial de bens é aquele em que, durante o casamento ou união estável, todos os bens adquiridos de forma onerosa após a oficialização da união se tornam patrimônio comum do casal. Ou seja, cada cônjuge ou companheiro tem direito a 50% dos bens adquiridos durante a relação, salvo exceções estabelecidas no Código Civil. Bens recebidos por herança ou doação, por exemplo, não se comunicam, permanecendo de propriedade exclusiva de quem os recebeu.
Principais artigos do Código Civil sobre o tema:
- Artigo 1.658: Dispõe que os bens adquiridos durante o casamento, no regime de comunhão parcial, pertencem igualmente aos dois cônjuges. “No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes”
- Artigo 1.659: Lista os bens que não se comunicam, como heranças, doações e bens anteriores ao casamento.”Excluem-se da comunhão:
I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III – as obrigações anteriores ao casamento;
IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.”
- Artigo 1.660: Relaciona os bens que integram o patrimônio comum, incluindo aqueles adquiridos com esforço comum ou individual durante o casamento. “Entram na comunhão:
I – os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II – os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III – os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV – as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V – os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.”
- Artigo 1.666: Estabelece que, após a separação, deve ser realizada a partilha dos bens, de modo que cada cônjuge receba sua parte proporcional. ” As dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam os bens comuns.”
Decisão recente do TJDFT sobre o pagamento de aluguel após separação
Um caso recente julgado pela 4ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) trouxe à tona uma questão importante no regime de comunhão parcial de bens: a necessidade de compensação financeira pelo uso exclusivo de um imóvel ainda não partilhado após a separação.
No caso, o autor e a ré foram casados por mais de 10 anos sob o regime de comunhão parcial de bens. Após a separação, a ré permaneceu residindo no imóvel, enquanto o autor continuava a arcar com o pagamento das parcelas do financiamento, taxas de condomínio e pensão alimentícia para a filha do casal. O autor, então, ajuizou uma ação requerendo o pagamento de aluguéis proporcionais ao uso exclusivo do bem pela ex-esposa, argumentando que, embora não utilizasse o imóvel, era co-proprietário e, portanto, tinha direito a uma compensação.
Argumentos da ré e decisão judicial
A ré defendeu-se alegando que morava no imóvel com a filha menor e que ambos os pais são responsáveis pelas despesas dos filhos, incluindo moradia. Além disso, ela argumentou que não deveria pagar aluguel, uma vez que a partilha dos bens ainda não havia sido realizada.
Contudo, o juiz de primeira instância e os desembargadores do TJDFT entenderam que, conforme amplamente adotado pela jurisprudência, o coproprietário que não está na posse do bem tem direito a receber aluguéis proporcionais à sua cota-parte no imóvel, mesmo que a partilha ainda não tenha sido realizada. A sentença foi mantida integralmente, reconhecendo o direito do autor de ser compensado pelo uso exclusivo do imóvel pela ex-esposa.
Implicações da decisão para casais sob o regime de comunhão parcial de bens
Essa decisão reforça que, no regime de comunhão parcial de bens, ambos os cônjuges possuem direitos iguais sobre o patrimônio adquirido durante a união. Após a separação, o uso exclusivo de um bem comum por uma das partes pode gerar o direito à compensação financeira, como no caso do pagamento de aluguéis.
Além disso, a decisão esclarece que a cobrança pode ser feita desde o momento da separação, mesmo que a partilha formal dos bens ainda não tenha sido realizada. Esse entendimento protege o cônjuge que não está em posse do bem, evitando que ele continue a arcar com os custos sem usufruir do patrimônio.
Conclusão
O regime de comunhão parcial de bens assegura que o patrimônio adquirido durante o casamento ou união estável seja dividido igualmente entre as partes. Contudo, em situações de separação, questões como o uso exclusivo de imóveis ainda não partilhados podem gerar obrigações financeiras, como o pagamento de aluguéis. Decisões como a do TJDFT mostram que a justiça busca equilibrar os direitos e deveres de cada parte, protegendo tanto o patrimônio quanto a equidade entre os ex-cônjuges.
Referência: PJe2: 0705548-05.2019.8.07.0009