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Direito de vizinhança e o uso anormal da propriedade

O direito de vizinhança existe para limitar a propriedade em favor do bom convívio social entre vizinhos.

Para o Direito, o conceito de vizinho não se resume ao sujeito que reside na propriedade ao lado. Para a norma jurídica, os vizinhos são aqueles que moram em um mesmo quarteirão ou bairro, por exemplo.

Como as regras do direito de vizinhança são recíprocas a todos os moradores de determinada área, o art. 1.277, “caput” e parágrafo único do Código Civil, dispõe sobre o uso anormal da propriedade.

Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.

O uso anormal da propriedade seria a utilização nociva da propriedade, que viesse a perturbar a saúde, sossego e a segurança dos vizinhos. Pode-se citar como exemplos: cachorro latindo, fumaça, esgoto, “música alta” após determinado horário, etc.

De acordo com a jurisprudência:

EMENTA: APELAÇÃO. AÇÃO COMINATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RUÍDOS EXCESSIVOS. POLUIÇÃO SONORA. IMÓVEL VIZINHO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. ARBITRAMENTO. 1- O art. 1.277, do Código Civil, determina que “o proprietário ou possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha”. 2- A poluição sonora emitida pelo apelado causou dano moral aos apelantes, vizinhos do estabelecimento, provocando-lhes perturbação e tirando-lhes o sossego e a tranquilidade em sua moradia. 3- O arbitramento econômico do dano moral deve ser realizado com moderação, em atenção à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes. Ademais, não se pode olvidar, consoante parcela da jurisprudência pátria, acolhedora da tese punitiva acerca da responsabilidade civil, da necessidade de desestimular o ofensor a repetir o ato.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0000.18.145743-3/001, Relator(a): Des.(a) Cláudia Maia , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 23/01/2020, publicação da súmula em 23/01/2020) (grifo nosso)

 

O artigo trazido pelo Código Civil é muito amplo e subjetivo, e a definição de segurança, sossego e saúde, dependerá do caso concreto, mas o juiz poderá utilizar de dois critérios objetivos para chegar à resolução do conflito: a pré-ocupação (que verificará qual morador chegou primeiro naquela vizinhança) e a destinação do bairro, se é uma região residencial, comercial ou industrial.

Para o vizinho que perturbe a saúde, sossego e segurança dos outros moradores, ele poderá ter como sanção o pagamento de uma indenização, ou simplesmente a obrigação de fazer cessar o inconveniente, mas a busca pela resolução do conflito dependerá de uma análise do caso concreto.

É importante destacar que, na hipótese do uso da propriedade não extrapolar os limites da normalidade, ou seja, quando o incômodo estiver dentro dos limites da tolerância, teremos um uso normal da propriedade causando incômodos normais, e este deve ser obrigatoriamente suportado pelo morador, conforme se destaca abaixo:

EMENTA: APELAÇÃO – AÇÃO DE DANO INFECTO – PROVA PERICIAL – IMÓVEL VIZINHO – INTERFERÊNCIA PREJUDICIAL – USO ANORMAL – NÃO CONFIGURAÇÃO.
A norma do artigo 1.277 do CC tutela o direito de um vizinho reclamar do outro a cessação de certa conduta mediante a subordinação a dois requisitos cumulativos, a existência de interferência prejudicial que atinja certos interesses previstos em lei (segurança, saúde e o sossego), que essa interferência decorra de uso anormal do imóvel (aferição da normalidade do uso e da interferência entre vizinhos, considerando-se a natureza da utilização e a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas). Como a prova pericial certifica a não interferência prejudicial à segurança, sossego ou saúde ao imóvel vizinho em virtude da utilização da propriedade, de rigor o não acolhimento da pretensão de cessação das atividades normais praticadas no imóvel acusado de agasalhar condutas anormais.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0016.15.009469-2/002, Relator(a): Des.(a) Renan Chaves Carreira Machado (JD Convocado) , 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 29/01/2020, publicação da súmula em 04/02/2020) (grifo nosso)

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