Em 30 de dezembro de 2024, ao fazer meu ultrassom morfológico de 1º trimestre, descobri que o coração do meu bebê não batia mais. Aquele momento foi traumático, um soco no estômago. Sequer um copo de água nos foi oferecido, apenas um papel da Unimed para assinar. Havíamos feito o chá revelação no dia 24 de dezembro e descoberto que era um menino, nosso Vítor.
Acolher a dor da perda e respeitar o tempo de quem enfrenta o luto profundo de perder um filho passam a ser obrigações legais no Brasil a partir desta segunda-feira, 25 de agosto de 2025, com a entrada em vigor da Lei nº 15.139, de 23 de maio de 2025, que institui a Política Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental.
Antes de passar por isso, eu sequer imaginava o que significava este luto. Hoje entendo a urgência de se garantir que famílias enlutadas tenham atendimento específico e multidisciplinar. Eu tive a sorte de encontrar uma equipe acolhedora no momento da curetagem, no dia 04 de janeiro: uma médica plantonista que trouxe leveza, uma enfermeira que me abraçou e cantou enquanto o anestesista aplicava a injeção, meu marido firme ao meu lado e, sobretudo, o direito de ver o meu bebê respeitado. Mas não pode depender de sorte. A lei agora assegura que cada mãe tenha o direito de se despedir com dignidade.
A dimensão desse tema é enorme. Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), até 20 de agosto de 2025, o estado registrou 747 mortes neonatais. Em 2024, foram 1.710 casos. As perdas gestacionais, quando ocorrem entre a 22ª semana e o momento do parto, são registradas como óbitos fetais. Cada número representa uma família atravessada por uma ausência irreparável.
A lei determina que hospitais e unidades de saúde ofereçam apoio psicológico, acomodação separada para mães enlutadas, espaço adequado para despedidas e respeito às escolhas da família quanto ao sepultamento ou rituais fúnebres. Também assegura o direito de nomear o bebê nascido morto, uma medida simbólica, mas profundamente significativa para o reconhecimento daquela vida.
Como operadora do direito, sei que a letra da lei, por si só, não transforma realidades. É um avanço civilizatório, mas que dependerá de implementação séria e sensível por parte de gestores, profissionais de saúde e toda a sociedade. A dor do luto parental não se supera com pressa. Ela pede acolhimento, empatia e respeito.
Mais do que uma política pública, a Lei do Luto Parental é um convite coletivo à humanidade: parar de silenciar o luto, reconhecer a legitimidade dessa dor e permitir que cada família viva sua despedida de forma digna. A morte de um filho não apaga o amor, apenas o ressignifica.